Quando a loucura salva a arte
Arthur Bispo usando o "Manto de Apresentação" |
“De médico e louco todo mundo tem um pouco.” Já dizia o Dr. Bacamarte no livro O Alienista, de Machado de Assis. Nesse momento, vamos explorar uma paráfrase. De artista e louco todo mundo tem um pouco.
Não é raro vermos pessoas que desprezam os que são chamados de loucos. No entender da grande maioria, até um pensamento diferente pode ser loucura. Muitos filósofos só foram conhecidos após sua morte, e ainda mais por terem morrido loucos.
Nesse texto, iremos conhecer um pouco de um grande sergipano que passou a maior parte de sua vida internado no hospital psiquiátrico Juliano Moreira, RJ, por mais de 50 anos. Arthur Bispo do Rosário nasceu na cidade de Japaratuba, ano de 1909.
Atualmente, Arthur Bispo que foi marinheiro, pugilista e borracheiro é conhecido como um grande artista, mas em vida foi conhecido como louco (e somente isso). Pouca importância foi concedida às obras do artista quando em vida. Apesar de suas obras serem de uma originalidade fantástica, o artista se negava a ser reconhecido por tal nome. Ele acreditava que sua obra era de caráter divino, sendo sua criação mais conhecida “O Manto de Apresentação” que consistia em um emaranhado de fios, nomes de pessoas, entre muitas outras coisas. Arthur Bispo acreditava que fora enviado do céu, e que usaria seu manto no dia do juízo final, tendo poder pra julgar os vivos e os mortos. Muitos livros já foram escritos sobre a obra desse peculiar artista. Um belo exemplo é o livro (que foi tese de doutoramento) de Marta Dantas Arthur Bispo do Rosário – A poética do delírio, (Unesp, 2009)
Arthur Bispo foi diagnosticado com “esquizofrenia paranóica”, em pesquisas feitas sobre a obra do artista, é possível percebermos o quão grande é a visão dele sobre a humanidade. Muitos interpretam que a junção de várias coisas em suas obras era a vontade que ele tinha de ajudar as pessoas. Arthur Bispo gostava de dizer que era ‘filho de Deus e nascido da Virgem Maria’, quando perguntado sobre sua origem dizia: ‘Um dia, eu simplesmente apareci’. Desprezava origens e culturas de determinado grupo.
Se Drummond dizia encontrar poesia em tudo, Arthur Bispo encontrava arte em todos os objetos. A maioria era do lixo do hospital que esteve. Lixo esse que serviu para uma criação inédita, que muito artistas lúcidos não conseguiram com seus “materiais de burguesia”. Suas obras ganharam notoriedade internacional, sendo expostas na ambicionada Bienal de Veneza, na Itália e Museu Jeu de Paume, em Paris. Também esteve em muitos outros países e em vários destaques no Brasil, a exemplo da 30ª Bienal de São Paulo.
O artista morreu em 1989 com 80 anos, vítima de infarto. Sua obra deixou um grande tesouro, não só nos objetos, mas na forma de pensar a realidade. “Quando eu subir, os céus se abrirão e vai recomeçar a contagem do mundo. Vou nessa nave, com esse manto e essas miniaturas que representam a existência. Vou me apresentar.” Arthur Bispo do Rosário.
Por Edivan Santtos
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